sábado, 17 de março de 2018

Minha tia Onira

Hoje morreu a minha tia e madrinha Onira. Estou aqui longe, sem nem saber o que fazer.

Lamento pela minha mãe, que deve estar com o coração partido. Sempre foram muito próximas. Acho que nos últimos anos a tia era a pessoa com quem ela falava diariamente e a quem via várias vezes durante a semana. Além de ser a irmã mais velha. Perder um irmão, imagino, dever ser algo bem doloroso.

Desde que me entendo por gente, a tia sempre esteve presente. Antes mesmo de eu ter alguma lembrança, eu costumava ficar em sua casa enquanto a minha mãe ia para a faculdade. Mais tarde, passava sempre uns dias das férias por lá. A tia sempre teve poucos recursos, mas lembro que quando íamos ao supermercado, ela sempre comprava uma balinha de caramelo para mim. Eu ficava feliz da vida. Era ainda na época pré-sacolinhas de plástico e me lembro que a tia sempre levava a própria sacola, que nas minhas lembranças era feita de napa.

Na adolescência, durante uns três ou quatro anos, eu costumava ir uma vez por semana a Vacaria, pois tinha que fazer a manutenção do aparelho ortodôntico. Depois de passar no dentista, eu ia almoçar na casa da tia. Comidinha boa, especialmente a sua maneira de fazer batata frita. Depois de adulta, lembro-me que uma vez pedi para ela fazer um almoço para mim, como fazia "antigamente". Ela fazia também uma carne com aipim cozido que era maravilhosa. Por muitos anos não comi a carne, mas adorava o molho que ficava no aipim.

Outra lembrança que tenho da tia é que ela fazia simpatias para tirar verrugas. Funcionou na que eu tinha na perna esquerda. Ela tinha esse dom.

A vida da tia nunca foi fácil. As irmãs brincavam que ela era dengosa e frágil. Podia até ser, na visão das irmãs mais novas, mas fato é que, logo no início da vida adulta, tudo passou a ser muito difícil. Divorciar-se nos anos 1970 não era uma coisa fácil. Passar a viver com o estigma de "divorciada", num país machista como o nosso, deve ter sido bem pesado. Ter que criar dois filhos pequenos com poucos recursos, pior ainda.

Eu não sei por que algumas pessoas têm a vida mais fácil e outras uma vida mais complicada. Até agora, faço parte do primeiro grupo. A tia sempre fez parte do segundo, ou pelo menos durante a maior parte de sua vida.

Em quase todas as vezes que eu ia visitar a mãe, dávamos uma passadinha lá para vê-la. Na última vez, em dezembro, ela estava extremamente magra. Havia enfrentado um câncer meses antes. Teoricamente estava tudo bem, mas a magreza e a dificuldade para comer, não eram bons sinais. Minha mãe e as duas tias sempre foram magras (genética que eu queria ter herdado), assim como meus avós, mas eu nunca tinha visto a tia tão magra.

Não chorei, mas estou triste. De forma meio egoísta, estou triste porque não vou mais encontrá-la quando for a Vacaria, porque não vou mais ser mimada com caquis ou pinhões colhidos para mim, porque ela não vai me mostrar como o horta está bonita e quais foram os últimos casaquinhos e sapatinhos de tricô que fez, não vai mais me perguntar se quero comer um doce de pêssego...

Eu não sei para onde a gente vai depois que morre - e se vai para algum lugar -, mas espero que a tia encontre paz e sossego, que de alguma forma saiba que foi muito amada por mim, pela minha mãe.

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